As coisas estão ali, não mais somente, como na perspectiva do Renascimento, segundo sua aparência projetiva e segundo a exigência do panorama, mas ao contrário, de pé, insistentes, esfolando o olhar com suas arestas, cada uma reivindicando uma presença absoluta que é incompossível com a das outras e que, no entanto, elas têm todas juntas, em virtude de um sentido de configuração cuja ideia não nos pode ser dada pelo "sentido teorético". Os outros também estão ali (eles já estavam ali com a simultaneidade das coisas), não de imediato como espíritos, nem mesmo como "psiquismos", mas tais, por exemplo, como os enfrentamos na cólera ou no amor: fisionomia, gestos, palavras às quais, sem pensamento interposto, as nossas respondem, a ponto de, algumas vezes, voltarmos suas próprias palavras contra eles antes mesmo que nos tenham atingido, tão seguramente, mais seguramente, do que se tivéssemos compreendido- cada uma prenhe das outras e confirmadas por eles em seus corpos.
Penúltimo páragrafo do ensaio O Filósofo e sua sombra, Maurice Merleau-Ponty