Caminhando fui à Santiago
um irlandês que não tinha ideia de quem era, estava a meu lado
ou adiante
ou atrás
parecíamos a perfect couple, just ilusions...
distantes fisicamente e emocionalmente, congelado coitado
a não ser no tatami com o corpo de homem, onde parecia começar a derreter-se,
decompor-se.
No caminho aprendi dos meus esquemas
vieram todos à tona
eu assustei novamente, mas enfim, fiz tudo como sempre fiz
a não ser
um importante detalhe
não sabia que era tão forte e resistente
não sabia que desprezava tantos os outros homens e mulheres
e tinha interesse apenas por aqueles que competiam
que mostravam o poder que queriam exibir pelo caminho
mas também desprezava esses, e os ultrapassava numa hora surpresa
do dia, e depois pensávamos o que aconteceu que agora eles cansaram
e nós os passamos?
É preciso descansar os pés, muitas vezes a dor são pequenas bolhas...
e eu não entendia por que ora doía tanto e ora eu simplesmente esquecia...
white people problems não queria falar com ninguém a não ser
continuar nos meus esquemas com o irlandês
tudo entrou em colapso
eu o deixei com muita dor
ele voltou para as trevas de Cork city, enfim, home sweet home nos melhores
e piores tons de cinza, pedras de gelo do céu que não me interessa definitivamente
e depois de conhecer um americano ontem
penso que já estou melhor, já não gozava tantas vezes numa mesma noite
a sei lá quantos mil anos,
afinal, há tanta gente com tantas diferentes energias nesse mundo
e eu quero sair dos meus esquemas, cansei-me deles.
não quero possuir ninguém mais para além de mim mesma, basta!
Já sabia da minha insegurança, do meu medo dos outros
da minha não curiosidade para com as outras vidas, a não ser os velhos
esses sempre me interessavam... acho que penso que posso aprender, então me interessa
fiz um caminho espiritual com a natureza
colhia flores pelo caminho, banhava meus pés
e buscava as sombras das árvores, inclusive aprendi
que aprecio a beleza das árvores e das águas, todas as pontes pelo caminho.
Nunca imaginei que não cairia nem uma vez,
La Bruja fizemos numa tarde e depois fixamos a hamac em dois pinheiros
no topo da montanha, ficamos lá por duas horas e descemos ao vale
a bruxa apezinhou um pouco, mas eu achava que seria mais doloroso
enfim, somos fortes
vi tantos machucados por tombos no caminho
afinal, é escorregadio
pedregoso
ingrime e profundo
as montanhas azuis no horizonte, a névoa passando por nossas cabeças
e penetrando nas florestas,
ficava excitada toda vez que entravamos numa
os pássaros, cobras, sapos, cachorros e gatos
e homens e mulheres
tantos sorvetes com o sol a queimar
tanto pão e vinho, carbonara que agora é minha especialidade
estou grata.
O irlandês assustou com meus traumas, tem tudo e confessou-me que é infeliz
e quer morrer
eu o conheci só no tatami a flertar, mas ele não aceita e sofre
enfim o abuso que sofreu no colégio interno orientou o sexualmente
de algum modo que ele precisa lutar, mas ainda sim excitado, luta contra si próprio
já não me interessa, mas foi interessante e nunca vou esquecer
todos os percalços e apoio que ambos demos um ao outro.
Decididamente o que importa não é o destino, mas o caminho.
Os apressados cansam mais, não sabem a hora de descansar.
E não é legal ouvir a vida toda de uma pessoa em algumas horas
caminhando juntos. Enfim, a filosofia salva-me, e não posso compartilhá-la
acho mesmo que é uma atividade egoísta, quando puder ensinar será um gozo.
Toda vida parece muito interessante para si mesmo,
ou o contrário, desprezível para si mesmo...
Pensava que não evoluía, mas evoluo, já não me engano em relação a isso.
Santiago, Disney dos white people problems cristãos.
Consegui acompanhar militares, quando o irlandês que se pune tomando
testosterona a mais de 8 anos ficou pra trás, fiquei muito surpresa,
eu me pensava tão pequena e frágil.
Mas cheguei forte e grande, não sabia que podia
caminhar um dia inteiro, numa média de 20 km por dia
foram doze dias caminhando de Porto a Santiago
26 km no último,
nada iluminador a chegar
a não ser o sol na catedral
nas pedras
e os fake perigrinos a tirar fotos
e sabe-se bem quem são os reais peregrinos, e isso eu não sei explicar.
Os surtos, eu gostaria de não os repetir, mas sinceramente não vou voltar com
os remédios,
vou seguir caminhando.